sábado, 25 de julho de 2015

Take

Diferença entre «ensaio» e take. O ensaio vai paulatinamente levando à perfeição, não conta como produto, é presente em função de futuro. No take, a criação inclui a sua própria crítica, e é por isso que é interrompido várias vezes para recomeçar; a insuficiência ou fracasso de um take serve como um ensaio para o seguinte, mas o seguinte nunca é uma versão melhor que o anterior, mas sempre outra coisa (se for realmente bom).
O melhor da literatura é sempre take, risco implícito na execução, margem de perigo que faz o prazer do volante, do amor, com o que isso acarreta de perda sensível, mas ao mesmo tempo com esse compromisso total que, noutro plano, dá ao teatro a sua inconquistável imperfeição diante do cinema perfeito. 
Eu gostava de escrever senão takes. 

Júlio Cortázar, em A Volta ao Dia em 80 Mundos, Tradução de Alberto Simões, Cavalo de Ferro, pag. 310