quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Das Arenas


A Arena, tal como o Dojo, mais que um lugar, é um conceito per se. Uma arena ou um dojo faz-se na hora, aqui agora na Praia das Furnas ou numa praceta da Rinchoa, não interessa, a ideia faz o espaço.  Pelas arenas tivemos as touradas de Hemingway e Orson Welles, corridas de cavalos de Charles Bukowski, o baseball de Paul Auster ou Don DeLillo e o boxe de Norman Mailer e Martin Scorsese. Lembro-me de ter visto ao vivo uma tourada em criança e de ter gostado daquilo, não me impressionou a crueldade sobre o touro, o tempo tornou-me mais "impressionável", para o bem e para o mal. Assim como no meio do sangue é esquecido a complexidade do movimento e o trabalho do toureio, muito mais foi perdido naquele espectáculo que marcou uma era. Falo na batalha naval no Lago Fucina promovida pelo Imperador Cláudio: Frota de Rodes contra Frota da Sicília, 19 mil lutadores em 24 navios de guerra e 26 barcos menores divididos  em 25 para cada lado. As colinas, ao redor do lago, formariam um lindo anfiteatro natural. O número de espectadores parecia mais de meio milhão que duzentos mil. Foram mais de três mil mortos e cinco mil baixas. Danos colaterais, que houve ali muito fair play e civismo a la romana,  e gente deve ter ido contente para casa depois de dez dias de suspense e festança...  
De outras arenas o grande Krassimir Balacov disse numa entrevista que o futebol era parecido com a vida. Devia ter uns quinze anos quando li isso e não percebi a ideia, bola era bola, a vida vidinha. Depois comecei a entender Na arena relvado isso da vida é muito trabalhado. É um bom dum laboratório para quem pensar nela. Temos a vida suspensa. A arena verde põe-nos na experiência: tem vezes em que somos mais tácticos e calculistas, outras gulosos e bola para a frente, outras somos mais defensivos, noutras temos pica e fúria, outras damos baile, outras é levar uma tareia, outras em que o árbitro nos rouba, outras em que fazemos fita, outras que damos cacetada, outras em que só levamos porrada, outras em que jogamos tudo, outras em que não fazemos uma. Para nosso bem, em frente à arena não podemos carregar na pausa, não existem repetições de lances nem imagens em grandes planos e diferentes ângulos, o que, acreditem, nos permite ver melhor. Tomamos parte do espectáculo, respiramos o mesmo ar, ouvimos os mesmos sons. É daí que aprendemos, que extraímos o sumo à experiência, o que Hemingway tirava das touradas para o romance seguinte, ou Charles Bukowski, das corridas de cavalos. O momento só nosso perante as forças do jogo, carimbos e decalques, pedaços de "vida verdadeira". Ninguém dará por isso, fará a associação, verá aquele combate de boxe no romance de amor, no romance de formação aquelas corridas de cavalos ou na novela policial o tal campeonato mal perdido. A verdade prefere o verdadeiro ao verídico.