Sem que
sequer nos dêmos conta, há algo de primordial no modo como reagimos a uma
pulsação. Toda a nossa existência é governada por um ritmo de setenta e duas
batidas por minuto. Se o comboio teve um papel tão importante para os músicos
de blues, não foi só por lhes permitir viajar do Delta até Detroit; foi
sobretudo pelo ritmo das locomotivas e das próprias linhas: mudavas de linha,
mudavas de ritmo. É como um eco do que se passa no interior do corpo humano.
Mesmo que venha de uma máquina, de um comboio, a percepção que o teu corpo tem
disso é de natureza musical. O corpo humano é capaz de sentir ritmos até onde
eles não existem. Ouçam Mistery Train do Elvis Presley: um dos maiores temas de rock and roll de sempre, sem um único
instrumento de percussão. O ritmo é apenas sugerido; o corpo trata do resto.
Não é preciso torná-lo explícito. Julgo que as pessoas se enganam quando falam
de rock and roll. Não tem nada a ver com rock, tem tudo a ver com roll.
Keith Richards (com James Fox), "Life (2010), Tradução José Luís Costa, Theoria (2011)
Keith Richards (com James Fox), "Life (2010), Tradução José Luís Costa, Theoria (2011)